Entrevista concedida pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros, Serguei Lavrov, ao canal de televisão RT, Moscovo, 18 de março de 2022
Tradução não oficial do inglês
Pergunta: As sanções impostas à Rússia não têm precedentes, impactando negativamente a vida dos russos comuns, apesar de Washington estar a dizer que não visa os russos. O senhor poderia dizer quais são os objetivos das sanções e quem é realmente o seu alvo?
Serguei Lavrov: Creio que o objetivo das sanções é mais estratégico do que apenas a Ucrânia. O que estamos a ver atualmente na Ucrânia é a quintessência da política ocidental: marginalizar a Rússia, contê-la, travar o desenvolvimento do nosso país e reduzir a zero o seu papel na política, economia, comércio, desporto, arte, ciência e ensino mundiais. Estamos a assistir às medidas sem precedentes tomadas pelos nossos colegas ocidentais. Uma das principais tendências é o desejo dos EUA, que se vem patenteando cada vez sob a administração Biden, de restaurar o mundo unipolar. Eles pretendem transferir o conceito de crisol de raças do solo norte-americanos para o resto do mundo e dirigir os processos de derretimento. Acho que a União Europeia já deixou, a 99 por cento, de tentar ser independente. O Presidente Emmanuel Macron, claro, continua a repetir que a autonomia estratégica para a União Europeia é o seu objetivo e ele estaria a lutar para alcançá-lo, mas o meu palpite é que ele não teria sucesso. A Alemanha já está completamente disposta a seguir as orientações dadas pelos EUA. A situação do Nord Stream 2 indicou claramente qual é o lugar da Alemanha na política mundial. Os norte-americanos "convenceram" os alemães e outros de que eles, os norte-americanos, sabem muito melhor do que os europeus o que a Europa precisa para a sua segurança energética. Há muitos exemplos como este. Por isso, as sanções vão continuar, eles estão a ameaçar-nos com uma quinta vaga, pode ser que venha a haver outra vaga, já estamos habituados a isso. Recordo que, muito antes da crise ucraniana que eclodiu devido ao golpe de Estado inconstitucional e ilegal, as sanções já nos haviam sido impostas. Assim que a emenda Jackson-Vanik foi revogada, a Lei Magnitski foi imediatamente aprovada. As sanções, de uma forma ou de outra, permaneceram.
Depois houve outra série de sanções para nos punir por apoiarmos a causa legítima dos russos na Ucrânia e dos russos na Crimeia. O senhor está a par do assunto, pelo que eu não vou repetir o que aconteceu.
A ronda de sanções mais recente não tem precedentes. Como o Presidente da Rússia, Vladimir Putin, disse somos agora campeões em termos do número de sanções impostas, mais de cinco mil. Isto é quase o dobro do número de sanções impostas à Coreia do Norte e ao Irão. Todavia, as sanções tornaram-nos sempre mais fortes. Em 2014, ficámos sob sanções porque o Ocidente não quis aceitar os resultados da votação livre da população da Crimeia que se manifestou a favor da reunificação com a Federação da Rússia, tendo, de facto, apoiado o golpe de Estado inconstitucional na Ucrânia. Quando falo com os nossos colegas ocidentais sobre esses acontecimentos, eles costumam deixar de lado da conversa períodos históricos indesejados. Para eles, a história começa com a "anexação" da Crimeia enquanto tudo começou quando a União Europeia não conseguiu fazer com que o acordo que ela havia garantido não fosse implementado. De facto, a oposição "pôs no lixo" o acordo garantido pela União Europeia. Os líderes da oposição e dos chamados protestos de Maidan, os radicais como Dmitry Yarosh diziam que eles queriam uma Ucrânia sem russos e “katsaps" (que significa moscovitas). Ele declarou publicamente que os russos da Crimeia nunca pensariam à ucraniana, nunca falariam ucraniano, nunca glorificariam heróis como Bandera e Shukhevich e outros colaboradores de Hitler, pelo que os russos deveriam ser expulsos da Crimeia. Na verdade, esta declaração foi feita algumas semanas antes de a população da Crimeia decidir ir a referendo, seguindo-se atos práticos. Foram enviaram grupos armados para tomar o parlamento da Crimeia, foi assim que tudo começou. No primeiro dia do golpe de Estado, os golpistas decidiram acabar com o estatuto oficial da língua russa na Ucrânia consagrado na Constituição ucraniana. Assim, todos estes "instintos" transformaram-se imediatamente traduzidos em políticas russófobas.
A ideia de expulsar os russos da Ucrânia continua a ocupar a mente dos políticos daquele país. Por exemplo, Oleg Tyagnibok, líder do partido ultrarradical, Svoboda ("Liberdade"), tem dito repetidamente sobre a necessidade de "desrussificação", o que significa que os ucranianos de origem russa não devem ter a sua língua, a sua história nem a sua identidade nem muitas outras coisas na Ucrânia. Todavia, para compreender melhor a atual situação, devemos recordar as declarações do Presidente Vladimir Zelensky. Eu já disse que os ultrarradicais haviam exortado a expulsar os russos da Crimeia. Em setembro de 2021, o Presidente Vladimir Zelensky disse o seguinte: "se vocês se consideram a si próprios russos, se vocês querem ser russos e ser amigos da Rússia, vão-se embora para a Rússia".
Voltando às sanções: vamos superá-las. As medidas elaboradas para o efeito pelo Presidente e o Governo já foram anunciadas. Este é apenas o início dos ajustamentos da nossa economia para adaptá-la à nova realidade. Depois de 2014, ganhámos experiência que nos permitiu contar com as nossas próprias forças. A maior lição que tirámos deste período histórico (ao contrário do que vimos em 2014) é a seguinte: se alguém tinha alguma ilusão de que podíamos contar com nos nossos parceiros ocidentais, esta ilusão foi completamente destruída. Agora, só podemos contar com nós próprios e com os aliados que permanecerão ao nosso lado. Esta é a principal conclusão para a Rússia no contexto da geopolítica.
Pergunta: Podemos dizer que a cultura russa se habituou a fazer parte de uma "aldeia" global. Isso significa que os países têm laços económicos estreitos, as pessoas podem circular livremente entre países. Como estas sanções vão influenciar a vida quotidiana dos russos numa perspetiva de longo e de curto prazo?
Serguei Lavrov: Bem, a avaliação do que está a acontecer, a meu ver, mostra claramente que o que a América quer que o mundo seja unipolar. Este não será uma "aldeia" global, antes uma "aldeia" norte-americana, um saloon norte-americano onde manda o mais forte. Acho que eles conseguirão unir as forças em torno de si e mobilizar todo o mundo ocidental com base nos seus próprios interesses. A dependência da NATO e da União Europeia é uma prova disso. Isso também mostra qual será o lugar da União Europeia na futura ordem mundial.
Há "players" que nunca aceitarão que a aldeia global seja governada pelo xerife norte-americano. São a China, Índia, Brasil, Argentina, México. Tenho a certeza que estes países não dirão "Sim, senhor" quando o Tio Sam lhes der uma ordem. Na verdade, quando os norte-americanos e os países ocidentais dizem que a Rússia foi "derrotada" na Assembleia Geral porque a maioria esmagadora dos países votou contra a ação russa na Ucrânia, isso pode levar ao engano. Se comparar as populações dos países que não votaram contra a Rússia com as dos que aplicaram sanções contra a Rússia, verá que a maioria dos que votaram contra nós fizeram-no sob enorme pressão e chantagem. Que eu saiba, alguns delegados receberam ameaças sobre os seus bens nos EUA, sobre as contas bancárias e os seus filhos que estudam em universidades norte-americanas, etc. Esta chantagem e pressão não têm precedentes e são amorais. A maioria dos países que votou com o Ocidente, não aprovou sanções nem o fará em relação à Rússia, pensando que é um preço demasiadamente alto pela cooperação com a Rússia e que o Ocidente só o faz para fins propagandísticos. Estaremos, como sempre, abertos à cooperação com qualquer país que se disponha a fazê-lo em pé de igualdade, respeito mútuo e equilíbrio de interesses. Os países a leste da Rússia estão muito mais dispostos a agir com base nestes princípios. Iremos certamente retribuir, o que será do nosso interesse e do dos nossos parceiros. Não somos nós que fechamos a porta ao Ocidente, é o Ocidente que nos fecha a porta. Quando eles voltarem à razão e quando esta porta ficar novamente aberta, analisaremos projetos de cooperação que nos proporão. Vamos cooperar com eles, lembrando-nos de que eles não parceiros confiáveis a longo prazo.
Pergunta: Gostaria de abordar a questão dos laboratórios biológicos na Ucrânia financiados pelos EUA. A Rússia tenta chamar, há anos, a atenção do mundo para estes laboratórios. Recentemente, os militares russos apresentaram novas provas: documentos assinados por organizações norte-americanas. Porque o senhor acha que a comunidade internacional não presta atenção a estes factos? Washington e os seus aliados serão responsabilizados pelo que lá estão a fazer?
Serguei Lavrov: Um facto curioso. A operação militar especial iniciada por decisão do Presidente da Federação da Rússia, Vladimir Putin, pôs a descoberto muitas coisas que são muito importantes para compreender o que se está a passar. Recentemente, os militares da Rússia, juntamente com as forças das Repúblicas Populares de Donetsk e de Lugansk, descobriram documentos do Estado-Maior ucraniano que mostram que a Ucrânia havia preparado uma agressão de grande envergadura contra as Repúblicas de Donetsk e de Lugansk. A operação russa antecipou esta ameaça e não lhes permitiu implementar o que planearam. Não quiseram cumprir os acordos de Minsk e prepararam um Plano B para recapturar os territórios "perdidos", com um derramamento de sangue e escalada muito maiores do que os dos últimos oito anos
Como o senhor disse, foram também encontrados documentos relacionados com as atividades biológicas para fins militares desenvolvidas pelos laboratórios dos EUA na Ucrânia. Estes documentos trazem as assinaturas de altos responsáveis ucranianos e militares norte-americanos. Estes laboratórios foram criados pelos EUA em todo o mundo. Mais de 300 laboratórios em diversos países, dos quais muitos se encontram à volta da Federação da Rússia nas ex-repúblicas soviéticas, inclusive na Ucrânia. A Ucrânia é o maior projeto do Pentágono que o dirigiu através da Agência de Defesa para a Redução de Ameaças que era responsável pelas atividades de laboratórios biológicos especializados em desenvolver agentes patogénicos muito perigosos como peste, brucelose, antraz e muitos outros, que são realmente muito perigosos. Sabemos que eles fizeram experiências com potenciais infeções que poderiam visar os grupos étnicos residentes no leste da Ucrânia e nas regiões vizinhas da Rússia.
Levantámos esta questão em organizações internacionais durante os últimos 20 anos. Em 2001, sugerimos que os países participantes na Convenção sobre a Proibição de Armas Biológicas e Toxínicas desenvolvessem um mecanismo de verificação que fosse transparente, que fosse compreendido por todos e aplicado a todos, porque a própria Convenção previa consultas se um Estado participante tivesse suspeitas ou informação a esclarecer. Se, durante as consultas, surgissem provas convincentes, uma investigação deveria ser iniciada. No entanto, um mecanismo assim não existe. Precisamos de um mecanismo que nos permita reagir e tornar transparentes as atividades biológicas para fins militares onde quer que estas se realizem, seja no território nacional ou no estrangeiro.
Há alguns os norte-americanos anos decidiram que era demasiadamente perigoso fazer experiência no seu próprio solo, pelo que acharam preferível transferir as suas atividades perigosas para outros países. Estão a concentrar cada vez mais as suas investigações e experiências em torno das fronteiras da Federação da Rússia e da China. Por isso, insistiremos em que esta questão seja abordada no âmbito da Convenção sobre Armas Biológicas e no Conselho de Segurança da ONU, porque é uma ameaça evidente à paz e à segurança internacionais. Voltamos a salientar a importância de negociar um protocolo juridicamente vinculativo à Convenção sobre Armas Biológicas que obrigue os países signatários a tomar medidas transparentes. Não tenho a menor dúvida de que de os norte-americanos serão contra. Esta posição dos norte-americanos é inviável. Estou convencido de que um número cada vez maior de países compreende quão perigosos são estes planos. Vamos lutar.
Pergunta: O que o senhor tem a dizer sobre o papel de Washington nesta matéria? O Presidente Vladimir Zelensky pediu ao Ocidente que fornecesse armas ao seu país e a criação de uma zona de exclusão aérea na Ucrânia. Ao mesmo tempo, o Presidente dos EUA, Joe Biden, repetiu que isso não vai acontecer porque isso provocaria um conflito aberto entre a Rússia e a NATO e os EUA. Porque é que o governo de Kiev insiste em promover este roteiro?
Serguei Lavrov: O que quer que pense de algumas das declarações de Joe Biden, ele é um político muito experiente e compreende que é absolutamente inadmissível criar uma zona de exclusão aérea, fornecer aviões à Ucrânia e fazer outras coisas que implicam riscos de um confronto direto entre a NATO e a Rússia. Por outro lado, Vladimir Zelensky compreende que os EUA têm políticos muito menos responsáveis que estão a ser incitados pelo lobby ucraniano e movidos pelas determinações russófobas. Muitos deles têm assentos no Congresso. De vez em quando adotam resoluções em condenação à Rússia. Acho que Vladimir Zelensky espera que eles consigam persuadir o Presidente dos EUA a assumir uma posição mais conflituosa.
Deixámos bem claro que qualquer carga que chegasse à Ucrânia e que, na nossa opinião, contivesse armas, seria alvo legítimo para ataque. Isto é claro porque estamos a realizar uma operação cujo objetivo é erradicar qualquer ameaça à Federação da Rússia por parte da Ucrânia. Isto fazia parte das nossas propostas feitas em dezembro passado, altura em que sugerimos negociar com a NATO as garantias de segurança que codificassem os acordos anteriores alcançados ao mais alto nível, segundo os quais nenhum país deveria aumentar a sua segurança à custa da segurança de outros. Portanto, eles sabem do que se trata.
Eles falam também da defesa antimíssil. As autoridades de Kiev pensam ser possível pedir aos países da NATO que possuem sistemas de defesa antiaérea soviéticos que lhos entregassem.
Gostaria de lembrar aos países que podem pensar considerar esta possibilidade que os sistemas de defesa antimísseis de fabrico soviético e russo se encontram nos seus territórios ao abrigo dos acordos e contratos intergovernamentais e têm um certificado de utilizador final que não lhes permite enviar estes sistemas a países terceiros sem o nosso consentimento. Um compromisso completamente legal. Compreendo que, hoje em dia, um compromisso legal não é o que os nossos colegas ocidentais respeitam. Eles já "puseram no lixo" a ideia de presunção de inocência, de inviolabilidade da propriedade privada e muitos outros "pilares" sobre os quais os "valores liberais" se basearam durante tantos décadas e séculos.
Este é um assunto importante. Garanto-lhe que não permitiremos que estes riscos venham a tornar-se realidade. O objetivo da nossa operação é proteger a população civil que está há oito anos sob bombardeamentos, desmilitarizar a Ucrânia para que não nenhuma ameaça venha do território ucraniano e obter garantias de segurança, que se baseiem no princípio de segurança igual e indivisível para a Ucrânia, para a Rússia, para todos os países europeus. Temos vindo a propor isto há muitos anos. A desnazificação é um imperativo. Este processo implica a revogação das leis que estimulam a ideologia e as práticas nazis e que discriminam a população russófona e os seus direitos.
Pergunta: Falámos muito sobre os métodos de guerra comummente praticados. Vamos falar sobre uma guerra de informação. Há alguns dias, a Casa Branca fez um briefing com alguns tiktokers famosos nos EUA, contando-lhes, de facto, sobre as novas narrativas promovidas por Washington. O que é acha desta técnica de propaganda desleal da Casa Branca? Normalmente é a Rússia que é acusada de guerra de informação.
Serguei Lavrov: Somos um player pequeno na guerra de informação internacional. O espaço de informação mundial é dominado pelos meios de comunicação social norte-americanos, britânicos, alemães e franceses. Outra coisa é saber qual é a qualidade da informação produzida pelos mass media ocidentais. Tomemos como o exemplo a CNN, eles preferem evitar materiais analíticos, concentrando-se principalmente em manchetes: "A Rússia é um agressor", "A Rússia está a matar civis", "A Rússia está a usar doping no desporto", etc.
Quanto ao TikTok e outros recursos, Washington dirige-se, na realidade, às crianças. O TikTok é usado sobretudo por adolescentes. Acho que procura lavar-lhes o cérebro para o resto das suas vidas. É ignominioso e injusto.
Se se quer competir no campo de informação, deve haver regras.
Gostaria de recordar ao senhor e aos espectadores do seu canal que, em 1990, altura em que a União Soviética vivia sob o conceito de "nova mentalidade", valores humanos comuns, os nossos colegas ocidentais e a Organização para a Segurança e Cooperação na Europa estavam a promover (com o apoio do governo soviético) uma série de documentos da OSCE sobre a liberdade de expressão e sobre o livre acesso à informação aprovados por consenso pela OSCE. Não obstante, o canal RT e a agência Sputnik não tiveram acesso aos briefings e conferência de imprensa no Palácio do Eliseu, em Paris, durante muito tempo. Quando dissemos aos nossos colegas franceses que esta prática ia contra os seus compromissos na OSCE, eles disseram-nos que o princípio do acesso à informação só era aplicável aos meios de comunicação social enquanto o canal RT e a agência Sputnik não eram meios de comunicação social, mas instrumentos de propaganda.
Outro exemplo de incumprimento dos compromissos. Há alguns anos, Londres acolheu uma conferência global sobre a liberdade dos media. Os jornalistas russos não foram convidados.
Conhecemos todos os métodos de manipulação dos meios de comunicação social usados pelos países ocidentais. Compreendemos há muito tempo que não existia um conceito de meio de comunicação social ocidental independente. Só a cadeia de televisão Fox News dos EUA procura apresentar pontos de vista alternativos. Outros canais de televisão, recursos da internet estão a ser censurados (bloqueando-se as contas de um Presidente em exercício). Verifica-se a substituição de conceitos. Sempre que ocorrem protestos em massa que lhes não agradam, rotulam-nos de terrorismo doméstico. Portanto, é uma guerra em que métodos de terrorismo da informação estão a ser usados. Não tenho a menor dúvida.
Gostaria de citar um exemplo curioso. Ontem, o jornal alemão Bild publicou um artigo a dizer que, na noite de 16 de março, eu havia deixado Moscovo com destino à China. Perto da cidade de Novosibirsk, o meu avião fez retorno ou porque o Presidente da Rússia, Vladimir Putin, me pedira para eu voltar ou porque a China não quisera falar connosco. A informação era de um tabloide com uma tiragem de milhões de exemplares. É vergonhoso os nossos "amigos" usarem métodos como este no campo de informação. Não foi por acaso que o Presidente Vladimir Putin usou a expressão "império da mentira".
Pergunta: O conflito na Ucrânia não vai durar para sempre. Quando terminar, quais serão as principais dificuldades nas relações entre a Rússia e a Ucrânia?
Serguei Lavrov: Nunca tivemos problemas com o povo ucraniano. Tenho muitos amigos ucranianos, os dois povos são muito próximos: praticamente todos ucranianos falam russo, aqueles que não falam, compreendem a língua russa. Temos uma cultura, história comum, modo de vida, atitude para com a vida, tradições em famílias e na sociedade. Por isso, espero que, quando esta situação terminar, tudo volte ao normal.
Este processo não será rápido. Os nossos colegas ocidentais tentaram tornar a Ucrânia russófoba, uma espécie anti-Rússia, como o Presidente Putin o caracteriza. Começaram a fazê-lo há muito tempo. A nova mentalidade lançou raízes profundas na Ucrânia, sobretudo nos jovens que nasceram após a desagregação da União Soviética. Foram muito indoutrinados.
Foram feitas tentativas sistemáticas de formar militares com base na ideologia radical de Bandera e Shukhevich para que nunca fossem amigos da Rússia e para que as determinações nacionalistas servissem para o reforço do Estado ucraniano.
O objetivo foi sempre o de garantir que a Ucrânia não fosse amiga da Rússia. Nos finais dos anos 1990, Zbigniew Brzezinski disse: "A Rússia com a Ucrânia amiga ao seu lado seria uma superpotência. A Rússia com a Ucrânia inimiga ao seu lado seria um player regional." Este conceito está profundamente enraizado nas mentes dos políticos norte-americanos. Será necessário tempo para acabar com esta "herança" negativa.
Agora as forças armadas ucranianas estão a lutar, tentando protelar a crise. Os líderes da Ucrânia reformaram, com a ajuda dos EUA e de outros países ocidentais, as forças armadas e colocaram no comando os oficiais e radicais formados na ideologia de Bandera. Estes últimos radicalizam e aterrorizam aqueles que não acreditam que este deva ser o destino do seu país.
A sua conduta na cidade de Mariupol é um exemplo disso. Dezenas de milhares de refugiados que abandonam Mariupol com destino à Rússia contam tais histórias. Assusta ver estas pessoas no comando das forças armadas ucranianas. Estou certo de que, mais cedo ou mais tarde, a proximidade histórica de duas nações irmãs irá certamente triunfar.