Principais pontos do briefing proferido pela porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Maria Zakharova, Moscovo, 20 de julho de 2023
Ponto da situação na crise da Ucrânia
No dia 18 de julho, no final de mais uma reunião (a décima quarta) do Grupo de Contacto para a Defesa da Ucrânia realizada na base de Ramstein, os EUA anunciaram um novo pacote de ajuda militar no valor total de 1,3 mil milhões de dólares. O regime de Kiev vai receber sistemas de defesa antiaérea, drones kamikaze, equipamento de combate aos veículos aéreos não tripulados, quantidades significativas de munições e outras armas.
Naquele mesmo dia, numa conferência de imprensa no Pentágono, o Chefe do Estado-Maior Conjunto dos EUA, Mark Milley, disse francamente que os patrões ocidentais tinham planeado cuidadosamente a contraofensiva das forças armadas ucranianas.
Aconselho os dirigentes norte-norte-americanos a coordenarem as declarações dos seus representantes. Temos ouvido constantemente a Casa Branca afirmar não estar envolvida nas ações praticadas pelo regime de Kiev nos campos de batalha contra as tropas russas nem naquelas contra a população civil. No entanto, Mark Milley tem uma opinião diferente. Segundo ele, os Estados Unidos tinham treinado mais de mais de 63.000 efetivos ucranianos que compunham 17 brigadas. No entanto, essas forças não foram suficientes para o regime de Kiev reportar, e seria bom que o tivesse feito na véspera da cimeira da NATO, as "novas vitórias" que tinha prometido alcançar aos seus patrões, pedindo novos e novos lotes de ajuda. É óbvio que a situação atual no teatro de operações não lhes agrada. O regime de Vladimir Zelensky está a ser pressionado a justificar os recursos nele injetados e a prosseguir a contraofensiva suicida a todo o custo. Mark Milley afirma sem rodeios que a contraofensiva ucraniana não está terminada e que será, e passo a citar, "lenta, complicada e sangrenta".
O que, na vossa opinião, deve ser o regime de Kiev se ele se prontifica a seguir cegamente a vontade dos seus patrões que pretendem tornar a sua vida numa existência lenta, complicada e sangrenta?
A 18 de julho, o Ministro da Defesa britânico, Ben Wallace, admitiu que a Ucrânia se tornou "um laboratório de combate do século XXI" para o Ocidente. É evidente que Londres encara os ucranianos como ratos de laboratório ou cobaias, como material dispensável e exigindo que atuem de forma mais resoluta no campo de batalha.
No entanto, o regime de Kiev levado ao poder pelo Ocidente responde da forma como costuma responder aos seus slogans nazis. Afirma que está pronto a ceder o seu território para os testes de armas ocidentais (e não apenas de novas armas). Já citámos muitas vezes as declarações de representantes oficiais do regime de Kiev que exortaram o Ocidente a testar as suas novas armas no território ucraniano e nos ucranianos e não nos campos de ensaios.
Tudo isto mostra que os anglo-saxões atuam como catalisadores da crise ucraniana e contribuem para a sua escalada. Não se deixam deter pelas mortes de civis nem pelas enormes baixas sofridas pelas forças armadas ucranianas. Para os generais norte-americanos e britânicos, é fácil lutar sacrificando outras pessoas, estão-se, de facto, nas tintas para a Ucrânia. A única coisa que lhes importa é infligir uma "derrota estratégica" à Rússia.
Na madrugada de 17 de julho, a Ponte da Crimeia foi novamente alvo de um ataque terrorista efetuado por meio de dois drones marítimos ucranianos. Dois civis, Aleksei e Natalia Kulik, foram mortos, ficando a sua filha Angelina, de 14 anos, gravemente ferida.
Gostaria de comentar a reação da comunidade internacional e do regime de Kiev. Olhem só, o regime de Kiev reconheceu o envolvimento dos serviços secretos ucranianos neste ataque sem esconder o seu orgulho. Viram como reagiu a sociedade ucraniana infetada pelo nazismo? Sugeriram que a menina ferida, que tinha visto, presa sob os destroços do carro, com os seus próprios olhos como morreram os seus pais, que viesse passar férias no centro de treino paramilitar "Azovets" e até prometeram encontrar pais "normais" para ela entre os nazis ucranianos.
Não estamos surpreendidos nem chocados com isso. Há muitos anos e décadas que andamos a comentar estas coisas, exortando a comunidade internacional a olhar melhor para as criaturas criadas, moldados ideologicamente e armados pelo Ocidente para refazer o destino de organizações já proibidas na Rússia, como o EI, a Al-Qaeda e outras.
A forma como esta entidade, alegadamente infantil, reagiu a este cruel assassínio merece uma referência especial. Não é segredo que na Ucrânia funciona um sistema que está a educar menores no espírito da Hitlerjugend (Juventude Hitleriana) que engloba campos pró-nazis de batalhões nazis, entre outros, onde as crianças aprendem a usar armas e a odiar pessoas de outras nacionalidades, onde a excecionalidade da nação ucraniana é apregoada e as crianças são ensinadas a ter prazer em matar russos, incluindo civis, a exterminar os russos, sejam eles quem forem. Esta é mais uma manifestação da natureza nazi do regime de Kiev.
Prestem atenção à reação da comunidade internacional. Ninguém reagiu ao ataque, nem à morte do casal civil, nem ao facto de uma menina ter sobrevivido a uma provação infernal. Os três só estavam a atravessar a ponte no seu carro. Repito que, muitas vezes, o Ocidente pega em histórias muito menos horríveis e trágicas e transforma-as em verdadeiras campanhas de informação. Mas só quando as coisas descritas servem a sua ideologia. Quando algo não se enquadra na sua visão do mundo, não se preocupam com o destino das crianças. Só se interessam quando é possível voltar a implicar com a Rússia: inventar um mito, uma história falsa, uma razão para discutir e censurar. Isso quando é preciso expressar simplesmente as suas condolências e dizer que não o devem fazer, porque morrem civis e sofrem crianças. O Ocidente não tem sentimentos nem emoções. Só tem sangue-frio e, mais ainda, aversão, porque não são as crianças certas, não pertencem aos "excecionais", ao "belo jardim", aos "cisnes brancos" como os ocidentais se identificam. É uma catástrofe para a humanidade quando um grande número de pessoas (ativistas políticos e sociais, jornalistas) mostram a sua essência desta forma, quando deveriam mostrar compaixão.
No passado dia 16 de julho, o representante oficial da Força Aérea ucraniana, Yuri Ignat, declarou que Kiev instala deliberadamente os seus sistemas de defesa antiaérea perto dos bairros residenciais. Ouvimos as mesmas declarações à margem da cimeira da NATO, quando os representantes ucranianos contaram histórias semelhantes, provavelmente procurando demonstrar como lisonjeiam o Ocidente. Aqui está uma nova revelação. Pelo que Ignat disse, estes sistemas, no seu estado atual, não podem operar longe dos bairros residenciais. De facto, ele confirmou que os extremistas ucranianos se escondem conscientemente atrás de civis, utilizando práticas e métodos de grupos terroristas.
Gostaria de dizer algumas palavras sobre a atitude do regime de Kiev para com a Crimeia. O regime de Kiev não pode desistir das expectativas irrealistas de "reincorporar a Crimeia na Ucrânia" e continua a elaborar planos sobre o seu "desenvolvimento futuro" (como lhe chamam). Para aumentar a atratividade económica da península, propõe cultivar drogas em massa e exporta-las para outros países.
Quanto ao desenvolvimento económico e lucro. A Crimeia reúne fantásticas capacidades turísticas e balneares. Vimos com os nossos próprios olhos o que era a Crimeia em 2014. Então, porque é que os " manda-chuvas" de Kiev não consideraram necessário tirar partido das coisas naturais da Crimeia: da sua natureza, da sua posição geográfica, do seu clima? Porque não fizeram nada: não construíram aeroportos, novas estradas, infraestruturas turísticas? Porque não desenvolveram tudo isso? Porque se tratava apenas de um "genocídio rastejante": fazer alguma coisa para travar o desenvolvimento dos territórios habitados pela população russófona que se alinhava com a história, a cultura e o património da Rússia. O regime de Kiev fez os possíveis para que esta região sofresse. Quando os de Kiev viram que, desde 2014, após a expressão da vontade da população crimeana, a Crimeia começou realmente a viver e a respirar, o regime de Kiev ficou com raiva, porque os crimeanos se atreviam a usufruir de tudo o que possuíam (território, capacidades turísticas)?
Ao mesmo tempo, o regime de Zelensky continua a tentar "limpar" a Crimeia dos não ucranianos, nomeadamente dos russos. Pretende submetê-los a represálias e deportações em massa, citando números que variam entre um milhão e 800 000 pessoas. Os ucranianos "nativos" serão incluídos em "listas negras". Em primeiro lugar, trata-se de crimeanos que "colaboram com as autoridades russas".
A arbitrariedade, as represálias e os campos de maconha são o futuro que os neonazis ucranianos e os seus inspiradores ideológicos ocidentais prepararam para a Crimeia. Acham que isto é uma fantasia? Tudo o que discutimos, incluindo a legalização da droga, já existe na realidade na Ucrânia. E há quatro, cinco, seis, sete, oito anos, quando não nos limitávamos a prever que isso acontecesse, mas as analisávamos, fazíamos previsões até onde a política de "europeização" da Ucrânia podia levar. Gozaram connosco, disseram que as nossas previsões eram propaganda e mentiras. Que mentiras? Tudo se tornou real. Felizmente, as forças armadas russas estão a defender a península. Sublinho que, antes da reunificação da Crimeia com a Rússia, em 2014, o regime de Kiev não prestava nenhuma atenção à península nem tinha o menor desejo de a desenvolver. Por um lado, a península era ucraniana, por outro, o regime de Kiev não achava necessário desenvolvê-la. Mais tarde, o ex-Presidente ucraniano, Petro Poroshenko, expressou a mesma lógica, mas em relação aos habitantes do Donbass. Afirmou que todos eles iriam sofrer e viver em caves e que aqueles que jurassem fidelidade às autoridades de Kiev levadas ao poder pelo Ocidente iriam prosperar. O mesmo se aplicava à Crimeia. Nos últimos anos, a península tem registado progressos impressionantes: foram construídas estradas, foram reparados hotéis e resorts de saúde, foi construído um novo aeroporto em Simferopol, foi construída a Ponte da Crimeia que, na opinião de Kiev, nunca deveria ter sido construída. Todas estas coisas são "fantasias de Moscovo". Mas foi a Rússia que fez tudo isto para desenvolver a economia e o turismo na península.
A Ucrânia só sabe destruir. Não me refiro ao país chamado Ucrânia, que também foi destruído, mas ao regime de Kiev. O novo ataque à Ponte da Crimeia, infraestrutura puramente civil, perpetrado no passado dia 17 de julho é outra prova disso. Apenas dois dias depois, a 19 de julho, o Diretor do Departamento Geral de Informações Militares do Ministério da Defesa ucraniano, Kirill Budanov, admitiu que o seu departamento e as forças armadas ucranianas haviam organizado um grande incêndio no distrito de Kirov, na Crimeia, devido ao qual foi encerrado um troço da autoestrada Taurida. Reportaram. Como eles costumam dizer, "eles desferem um golpe contra os seus". É tempo de decidirem o que pensam sobre a Crimeia. Consideram-na território de alguém? Vocês dizem que a Crimeia é sua. Ninguém trata deste modo os "seus". Ou vêem-na como território onde continua o genocídio rastejante? Penso que a segunda hipótese é certa. É óbvio. Os métodos terroristas tornaram-se habituais para o regime de Kiev, e os terroristas mais odiosos da história podem "invejar" a magnitude das suas ações.
Outro assunto relacionado com os horrores praticados pelo regime de Kiev deve ser abordado. O regime de Kiev continua a abusar dos padres da Igreja Ortodoxa Ucraniana. Na semana passada, o Metropolita Pavel, superior do Mosteiro de Kiev-Pechersk, foi colocado no centro de detenção preventiva, apesar de estar muito doente. De facto, isso equivale a tortura.
O valor da fiança com a qual o clérigo poderia ser libertado da prisão durante a investigação foi fixado em 33 milhões de grivnas, o que corresponde a quase 80 milhões de rublos. Este montante só pode ser pago por um oligarca. Além disso, as autoridades não permitiram sequer que as pessoas que simpatizam com o padre o ajudassem. A conta aberta para a recolha de fundos para pagar a caução foi bloqueada.
Uma comparação para ilustrar a situação criada. É pertinente e deve ser recordada. Na província da Transcarpátia, o valor da caução fixado para um criminoso acusado de traficar menores para a extração de órgãos era... O que é que acham, quanto? De um milhão de grivnas, ou seja, um montante 33 vezes inferior ao fixado para o metropolita. Conseguem imaginar? O juíz pôs em liberdade um pedófilo, um indivíduo pior do que um pedófilo, que traficava menores para a extração de órgãos, sob fiança de um milhão de grivnas. Agora o criminoso está solto e à procura de novas vítimas. E o Metropolita Pavel só pode ser libertado se pagar 33 milhões de grivnas, ou seja, as trinta moedas de prata. É surpreendente, mas é verdade. É outra prova da natureza satânica do regime de Kiev. Neste contexto, ocorre-me a história bíblica de Jesus e de Barrabás, um foi crucificado enquanto o outro, homicida, foi libertado. A história repete-se. As acusações e os maus-tratos infligidos ao hierarca da Igreja Ortodoxa Ucraniana demonstram, uma vez mais, as violações generalizadas dos direitos humanos e da liberdade religiosa, se usarmos termos do direito internacional universalmente aceites. Onde está o Ocidente, que todos os anos publica relatórios e lança acusações contra aqueles que perseguem representantes de diversas correntes religiosas? Parece que esta é uma oportunidade para fazerem uma declaração. Não está a acontecer nada. Eles não vêem nada, não ouvem nada e não se apercebem de nada.
Não excluímos que a perseguição aos clérigos ortodoxos faça parte da campanha do regime de Kiev destinada a pilhar e a levar para o Ocidente bens de valor cultural e relíquias ucranianas, dos quais muito se encontram em templos e mosteiros da Igreja Ortodoxa Ucraniana e no Mosteiro de Kiev-Pechersk. O Metropolita Pavel era um obstáculo.
Recorde-se que 16 peças únicas do Museu Nacional de Arte Bogdan e Varvara Khanenko, em Kiev, já foram levadas para França. Já comentámos este assunto. Os meios de comunicação social franceses anunciaram exposições que irão mostrar obras de arte retiradas de seis outros museus ucranianos. Acham que serão devolvidas à Ucrânia? Claro que não. De acordo com a diretora-adjunta do museu, Elena Zhivkova, "o objetivo da Ucrânia é levar o maior número possível de peças para museus na Polónia, Alemanha, Lituânia e França". Porque é que estão surpreendidos? Todos eles, os do "governo" de Vladimir Zelensky, foram levados ao poder pelo Ocidente. Agora estão a pagar por isso. Pelo menos, os solos humíferos já foram levados para lá. Agora é a vez das obras de arte e relíquias cristãs. Na semana passada, as forças armadas ucranianas continuaram a bombardear instalações civis nas novas regiões da Rússia, mostrando uma vez mais que o regime há muito que trata os seus habitantes não como seus compatriotas, mas como seus piores inimigos, e procura literalmente varrê-los da face destes territórios.
Nos dias 14 e 15 de julho, bairros residenciais da cidade de Alioshka, na província de Kherson, foram alvo de vários ataques, incluindo com a utilização de munições incendiárias. Como resultado, três casas e um carro civil foram destruídos. Os mass media fazem circular vídeos que mostram um grupo de extremistas ucranianos a disparar contra um carro com civis perto da cidade de Ugledar, a 14 de julho. Depois de terem cometido o crime, os ucranianos tentaram apagar os vestígios do crime, empurrando o carro com os mortos para fora da estrada. Onde estão todos? Onde está o Secretariado da ONU que acompanhou tão "de perto" a trajetória do voo do míssil norte-coreano? Segundo o Secretariado, o míssil terá aterrado numa zona económica especial do nosso país. Publicámos estes factos oficialmente. Este é um bom motivo para o Secretariado da ONU realizar uma investigação.
As forças armadas ucranianas lançaram um ataque de artilharia no bairro de Kubibishev, em Donetsk, que provocou um incêndio num bloco de apartamentos. Entre as pessoas atingidas encontravam-se crianças. Quando os extremistas ucranianos bombardearam o bairro de Chervonogvardéyski de Makéevka, uma mulher ficou ferida e morreu.
Estes são apenas alguns factos da lista de crimes cometidos pelas forças armadas ucranianas nos últimos dias. O Comité de Investigação da Rússia examina todos os bombardeamentos perpetrados pelos neonazis ucranianos contra a população civil. Os criminosos sofrerão um castigo inevitável.
Os factos acima mencionados e tudo o mais que é deixado à margem da atenção pública provam que os objetivos da operação militar especial de desmilitarizar e desnazificar a Ucrânia e de eliminar as ameaças à segurança da Rússia e dos seus cidadãos a partir do seu território continuam a ser relevantes. Compreende-se agora que esta é a ameaça à segurança do continente europeu e do mundo em geral. Não se esqueçam de que os ucranianos também estão a bombardear instalações nucleares.
Sobre a Cimeira UE - CELAC
Gostaria de comentar outro espetáculo de circo realizado pelo Ocidente e o regime de Kiev. Contrataram um palhaço e agora estão a festejar à grande.
Entre os dias 17 e 18 de julho, Bruxelas acolheu a primeira cimeira UE-CELAC desde 2015. A América Latina esperava que o evento ajudasse a consolidar a cooperação entre diferentes regiões no interesse do desenvolvimento socioeconómico, a resolver os problemas pendentes que os latino-americanos esperam superar através da interação com os seus parceiros em diferentes regiões do mundo, incluindo a União Europeia. E gostaria de recordar que muitos destes problemas foram criados pelo Ocidente.
Os debates mostraram que os países da UE condicionaram a solução das referidas questões à disponibilidade dos latino-americanos para "condenar a agressão russa". Tentaram mesmo, a bem da verdade sem sucesso, graças à posição de princípio dos latino-americanos, realizar na cimeira mais um show de apoio à Ucrânia com a participação de Vladimir Zelensky. No entanto, mais tarde (de acordo com os jornais ocidentais), a UE explicou a este último que não precisariam da sua ajuda naquele evento. Os chantagistas da UE continuam a torcer os braços. Não foi a primeira vez, e infelizmente não será a última, que vimos como os países latino-americanos que deram prioridade à inviolabilidade do direito internacional e não à fidelidade à "ordem baseada em regras" que ninguém leu porque simplesmente não existem se opuseram ao diktat da UE. Toda esta desordem praticada pela UE a mando de Washington foi rejeitada pelos países latino-americanos que defendem uma decisão política que tenha em conta as legítimas preocupações das partes (e que não assinaram nenhuns ultimatos).
Os países latino-americanos preocupados com a possível utilização de munições de fragmentação não permitiram que fossem tratados desta forma. Sublinharam, com razão, que o tema antirrusso não estava em pauta do diálogo UE-CELAC.
Já dissemos muitas vezes o que significa "a ucranianização forçada das relações internacionais". Esta questão continua a ser, sem dúvida, uma das mais importantes atualmente. Não se trata do conflito entre a Rússia e a Ucrânia, mas sim da guerra híbrida desencadeada pelo Ocidente, que utiliza a Ucrânia como instrumento de ação sobre o nosso país. Uma coisa é discutir as questões essenciais (seja a resolução da crise ou as suas causas) e outra coisa é impor como teses e elementos ideológicos ou memes os "cânticos" que são incorporados nos documentos e na agenda das conversações do Ocidente com os seus parceiros noutras regiões do mundo e que não se referem ao tema das mesmas.
Temos de constatar que os países que defendem o respeito pelo direito internacional e a simples ética diplomática enfrentaram um verdadeiro diktat por parte da UE que especulou com o empenho natural de todos os latino-americanos em reforçar a CELAC e elaborar respostas coordenadas para os desafios enfrentados pela região. Os países da UE tentaram pôr de mal a Rússia e a América Latina, à qual estamos ligados há décadas por tradições de amizade, afinidade cultural e cooperação mutuamente benéfica. Não há outro objetivo: se tivessem introduzido algumas teses dedicadas à Ucrânia em alguns documentos, o que é que teria mudado? Nada teria mudado, nem no campo de batalha, nem em matéria de sanções ilegítimas, nem no que respeita à melhoria da segurança alimentar. O seu objetivo é utilizar as reuniões com os latino-americanos para impor o ponto de vista ocidental e forçar os latino-americanos a aceitá-lo, e não para procurar soluções para a crise ucraniana. O seu objetivo é pôr de mal a Rússia e a América Latina e mostrar o seu diktat, a sua capacidade de utilizar a força. O Ocidente orgulha-se muito disso.
A falta de desejo dos países da UE e a sua atitude neocolonialista resultou em que a declaração final apresentada em Bruxelas como documento "acordado" e publicada no site da UE não fosse aprovada por consenso, conforme afirmou o chefe da diplomacia da Nicarágua (muitos outros países também o mencionaram).
Quanto à Rússia e aos laços russo-latino-americanos, aqueles que quiseram semear a discórdia entre nós não o conseguiram e não o conseguirão. Temos boas tradições de simpatia mútua e disponibilidade para interagir em pé de igualdade e manter um diálogo mutuamente benéfico com base em normas jurídicas internacionais universalmente reconhecidas, em primeiro lugar, no respeito mútuo, na atenção aos interesses de cada um e na compreensão das realidades globais modernas. Tudo isto só poderá ser consolidado.
Sobre o Festival da Cultura Latino-Americana e das Caraíbas em Moscovo
Moscovo acolherá, entre os dias 21 e 30 de julho de 2023, o Festival anual da Cultura Latino-Americana e das Caraíbas. O evento é organizado pelo Governo da cidade de Moscovo e goza de apoio das embaixadas dos respetivos países em Moscovo.
O Festival tem como objetivo familiarizar os moscovitas e os visitantes de Moscovo com a cultura única e original dos povos da América Latina. O Festival incluirá uma variedade de eventos, incluindo atuações de grupos de dança e de canto, exibições de trajes tradicionais, master classes para adultos e crianças e palestras temáticas sobre a história e a cultura dos países da América Latina e das Caraíbas. Está prevista a exibição de filmes contemporâneos da região.
A realização de um festival desses constitui um marco na cooperação cultural e humanitária russo-latino-americana. O Ministério dos Negócios Estrangeiros russo participará na cerimónia de abertura.
Para nós, a América Latina é um continente amigo com o qual a Rússia mantém um diálogo dinâmico e desenvolve uma cooperação construtiva que não está sujeita a um diktat externo.
Para mais informações sobre os eventos do Festival, consultem os portais da Internet do Governo de Moscovo.
Resumo da sessão de perguntas e respostas:
Pergunta: No outro dia, a UE anunciou uma nova iniciativa para criar um mecanismo de apoio às forças armadas da Ucrânia (para além do atual Mecanismo de Apoio à Paz) orçado em 20 mil milhões de euros e que tem duração de quatro anos. Poderia comentar esta iniciativa?
Maria Zakharova: Sabemos pelas notícias veiculadas pelos mass media que este tema está a ser debatido na UE e ser abordado na próxima reunião do Conselho de Ministros dos Negócios Estrangeiros da UE. Se for tomada uma decisão tão imprudente, isso significará um novo investimento maciço no prolongamento dos combates na Ucrânia. Por outro lado, os ocidentais dizem que este é o seu objetivo. A UE já gastou 15 mil milhões de euros em fornecimento de armas. Se acrescentassem um pouco mais a este montante, poderiam pagar a dívida nacional dos EUA. Penso que todos ficariam satisfeitos se tivessem tirado os EUA do abismo da dívida. Mas agora este dinheiro está a ser gasto em equipamento militar, com a ajuda do qual as forças armadas ucranianas estão a matar pessoas comuns e a destruir infraestruturas civis. A UE enviou fundos correspondentes, tanto através de canais bilaterais como através do Mecanismo Europeu de Apoio à Paz, que é mais correto ser chamado de "mecanismo de apoio à guerra".
Evidentemente, esta política da atual liderança da UE nada tem a ver com a preocupação com a segurança e a estabilidade na Europa. É um cinismo gritante. Esta é uma realidade terrível, divorciada da moral: os "estrategas" europeus, ensandecidos pelas suas ambições militaristas, como o chefe da diplomacia europeia, Josep Borrell, estão a tentar forçar os cidadãos da UE a pagar mais quatro anos de derramamento de sangue. Nem querem pensar sequer em canalizar fundos para os países necessitados, embora não se cansem de falar da segurança alimentar. Na verdade, tudo é simples. Se querem salvar o mundo da escassez de alimentos, deviam entregar produtos agrícolas aos necessitados: comprem com este dinheiro alimentos, paguem o transporte e os seguros para leva-los para junto dos necessitados. Tudo isto confirma que a Ucrânia e a sua população só interessam à UE como campo de ensaio para uma guerra híbrida com a Rússia. As ambições geopolíticas hegemónicas são o neoimperialismo, pelo que os lucros desta aventura e do fornecimento de armas são obtidos por empresas privadas. Tudo isto é apresentado como "novos valores" e a UE é aparentemente a sua guardiã. As consequências ambientais de tais ações são incalculáveis. No entanto, o meio ambiente, tal como a segurança alimentar, parece estar no topo da lista de prioridades da UE. Não é o mesmo que convidar Greta Thunberg a falar numa conferência. É preciso pegar num papel e numa caneta e calcular quanto dos 15 mil milhões foram gastos na destruição do sistema da região e quanto custará a sua reconstrução. Também não analisam o que acontecerá às armas que estão agora a entrar maciçamente no mercado negro de armas. Refiro-me às armas ilegais, porque muitos dos fornecimentos não chegam sequer às mãos do regime de Kiev, nem aos campos de batalha. Ficam nas mãos de revendedores e depois acabam nas mãos de terroristas e extremistas. Isto provocará um aumento da ameaça terrorista e extremista no continente. A UE afastou-se completamente dos princípios fundamentais da integração europeia. Tudo foi espezinhado: os negócios são controlados, não há liberdade de expressão, a corrupção é fora de escala. Tudo o que é apresentado como valores não é respeitado, e os antivalores são colocados num pedestal. A chamada integração europeia está a virar uma concha vazia.
Não é difícil prever que os países da Europa de Leste, em particular a Polónia e os países bálticos, particularmente interessados nos subsídios da UE, também tentem lucrar com o conflito, cobrando à Ucrânia um preço excessivo por armas obsoletas e baixadas do inventário. Estamos bem cientes destes esquemas "democráticos" nos países da UE. Já comentámos isso em várias ocasiões, tal como o desejo dos europeus de utilizar as hostilidades na Ucrânia para maximizar os lucros das empresas da indústria de guerra. E não só nós. Até os próprios meios de comunicação social ocidentais escrevem sobre o assunto.
Novas entregas de armas pesadas e de longo alcance, munições de fragmentação e projéteis de urânio empobrecido irão constituir uma prova importante do envolvimento da UE e dos seus Estados-Membros no conflito.
Há pouco tempo dei uma entrevista a um órgão de comunicação social estrangeiro na véspera da cimeira da NATO. Perguntaram-me se a NATO e os seus Estados-Membros estavam envolvidos no conflito e como a Rússia o qualificava. Como é que se pode qualificá-lo se eles não só fornecem dinheiro, armas, formadores militares, informações e apoio político, como também os planeiam para anos adiante? Isso só pode ser qualificado como envolvimento direto. Talvez caiba aos cientistas políticos ou aos juristas esclarecer a diferença entre envolvimento indireto e direto. Confirmamo-lo mais uma vez com factos: tais ações qualificam toda a atividade do Ocidente, e em particular da UE, como guerra híbrida contra o nosso país.
Especialmente se as armas e o equipamento militar fornecidos pelos patrões ocidentais ao regime de Kiev forem utilizados contra pessoas comuns, infraestruturas civis e o território da Federação Russa. Um dos princípios fundamentais da utilização de armas contra civis foi espezinhado pela UE. Não há dúvida de que os ataques à Ponte da Crimeia acontecem devido à ajuda e às entregas de armas e equipamento militar feitas pelos países ocidentais.
A Rússia fará os possíveis para garantir a sua integridade territorial e a segurança dos seus cidadãos e para assegurar que todos os envolvidos em crimes de guerra e ataques terroristas contra o nosso país e os seus cidadãos sejam levados à justiça.
Perguntam-nos frequentemente se dispomos de dados precisos sobre se um determinado drone ou uma determinada parte de um determinado projétil foi fornecido por países da NATO e da UE. Sim, temos. Além disso, tornámos públicos os números de identificação e as fotografias. No entanto, o mais importante é que as informações de inteligência e os dados para a orientação do fogo de artilharia são compartilhados pelos países ocidentais através dos seus satélites, equipas de reconhecimento e formadores militares. Na realidade, são aqueles que controlam o regime de Kiev e que foram enviados para lá pelos países ocidentais. Os países ocidentais são diretamente responsáveis por todas as atividades criminosas do regime de Kiev.
Pergunta: Poderia comentar a recusa do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem em julgar a queixa da Rússia contra a Ucrânia apresentada a 22 de julho de 2021, a pretexto de as autoridades russas não terem respondido aos seus numerosos pedidos de consulta?
Maria Zakharova: Esta é outra "obra-prima" do TEDH. Há uma expressão: não vale sequer o papel em que foi escrito. Não posso qualificar esta recusa como documento. Esta obra deve ser encarada como coleção de aforismos para demonstrar o mais alto grau de duplicidade de critérios, que se tornou a norma no Conselho da Europa. Isso mostra uma vez mais que a Rússia fez certo em se ter retirado deste organismo.
Permitam-me que vos recorde do que se trata. Em 2021, a Rússia apresentou à TEDH uma enorme quantidade de provas de violações dos direitos humanos por parte do regime de Kiev: discriminação da população russófona da Ucrânia, atrocidades sistemáticas contra os habitantes do Donbass, perseguição de jornalistas e de meios de comunicação social "pró-russos" (é assim que lhes chamam na Ucrânia), falta de desejo de investigar a tragédia em Odessa, os assassinatos na Praça de Maidan em Kiev, o facto de a Ucrânia não ter fechado o seu espaço aéreo, o que levou ao despenhamento do voo MH-17, o bloqueio da Crimeia e outras violações flagrantes por parte do regime de Kiev.
Já em 2021, tornou-se claro que o TEDH queria varrer todas as queixas inconvenientes para debaixo do tapete, fingir que não viu nem ouviu nada. Rejeitou por duas vezes os pedidos da Rússia de medidas provisórias que teriam incentivado o regime de Kiev a respeitar a Convenção Europeia dos Direitos do Homem. Para protelar o processo, o Tribunal recusou-se a juntar a nossa queixa aos casos que já estava a julgar, embora um ano mais tarde o fizesse em relação a outra petição ucraniana.
Agora, o TEDH não precisa sequer de esconder que está a levar água ao moinho do regime de Kiev. O Tribunal recusou-se a julgar graves violações dos direitos humanos cometidas pelas autoridades ucranianas porque não recebeu uma resposta da Rússia às suas cartas! Este facto, aliás, não o impede de produzir centenas de decisões contra o nosso país. Isto é absurdo. Faz-me lembrar a peça "O Inspetor-Geral", de Nikolai Gogol. É tempo de prestar atenção à queixa russa, porque o artigo 37º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem obriga o Tribunal a julgar um caso se "o respeito pelos direitos humanos assim o exigir". No caso da Ucrânia, de acordo com o TEDH, aparentemente isso não é exigido, porque qualquer pessoa pode apresentar queixas individuais contra o regime de Kiev.
Trata-se de um formalismo incompreensível levado ao ponto do absurdo. Se os habitantes do Donbass e todos aqueles em cuja defesa a Rússia se pronunciou tivessem tido a oportunidade de obter justiça nos tribunais ucranianos ou em Estrasburgo, não teria havido uma queixa russa acompanhada de anexos volumosos. Onde estão os padrões elevados da UE?
Além disso, gostaria de perguntar ao Tribunal por que razão persiste em escrever as suas cartas para o endereço não válido de um portal eletrónico, que a Rússia já não utiliza e que é puramente voluntário para os Estados. Ficou agora claro por que razão ignora as nossas numerosas notas de que o único meio de comunicação com Moscovo continua a ser o canal diplomático, através da nossa Embaixada em Paris. Gostaria de reafirmar mais uma vez que a nossa posição sobre este assunto se mantém inalterada.
Pergunta: O Chanceler austríaco, Karl Nehammer, manifestou o seu apoio à iniciativa de paz na Ucrânia avançada pelo Presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva. Note-se que a Áustria faz parte da UE. Como sabe, de acordo com o plano do Brasil, a comunidade internacional deveria reconhecer a Crimeia como parte da Rússia. Pensa que este plano continuará a ganhar popularidade na Europa ou no Movimento dos Não-Alinhados?
Maria Zakharova: Valorizamos os esforços de todos aqueles que estão sinceramente empenhados em tentar encontrar uma saída para este problema mundial global. Estamos particularmente gratos aos nossos parceiros brasileiros, que estão realmente a tentar apresentar algumas propostas e a encontrar uma solução de paz possível para a crise ucraniana. Vemos que o Brasil se tem sempre manifestado a favor das preocupações objetivas em matéria de segurança de todas as partes. Na minha opinião, o Brasil ainda não definiu os parâmetros concretos da sua iniciativa de paz.
A declaração do Chanceler austríaco, Karl Nehammer, de que o seu país apoia a iniciativa de paz é um sinal muito positivo. Mostra que os austríacos começam a compreender a necessidade de uma resolução pacífica da crise ucraniana com base em planos mais realistas, em vez das fórmulas de paz inviáveis propostas por Vladimir Zelensky.
Por outro lado, existe uma contradição óbvia na posição da Áustria. Ao promover estratégias pró-Kiev, ao abandonar a sua neutralidade tradicional para ir na esteira na UE, o que significa um apoio militar em grande escala a Kiev, os austríacos contribuem para a escalada das hostilidades e fomentam ainda mais o conflito. Por conseguinte, as suas palavras a favor da iniciativa brasileira só serão credíveis e farão sentido quando começarem a encorajar a Ucrânia a sentar-se à mesa das negociações e a exortar os dirigentes ucranianos à paz, em vez de aprovarem o fornecimento de armas e de se envolverem numa retórica agressiva. Infelizmente, fazem isso em relação a Moscovo.
Gostaria de lembrar a todos aqueles que querem ouvir a nossa opinião sobre as iniciativas de paz que estão a ser apresentadas agora e para aqueles que estão a começar a elaborar iniciativas de paz, que foi o lado ucraniano, o regime de Kiev que interrompeu as negociações mantidas em abril de 2022. Depois, alguns meses mais tarde, no outono de 2022, o regime de Kiev aprovou uma lei para proibir todas e quaisquer negociações com o nosso país. Na minha opinião, este é um aspeto fundamental que deve ser tido em conta.
Pergunta: A UE quer ouvir as Nações Unidas sobre as eventuais condições em que a Rússia poderia regressar ao acordo de cereais para depois decidir sobre a sua política de sanções antirrussas, disse uma fonte europeia de alto nível aos jornalistas em Bruxelas. Como avalia a parte russa as ações da UE? Qual é a probabilidade de Bruxelas aceitar as condições colocadas por Moscovo? Se a probabilidade for pequena, qual poderá ser a principal razão ou obstáculo que impede a UE de o fazer?
Maria Zakharova: É um beco sem saída a que a UE chegou e de que já falámos muitas vezes. O senhor coloca a questão referindo-se à posição da UE: "A UE quer ouvir a ONU sobre as eventuais condições em que a Rússia poderia regressar ao acordo de cereais". É absurdo convidar mediadores quando você mesmo bloqueia os contactos com a Rússia. Este é o resultado da política imposta pelos EUA à UE. Na ausência de uma oportunidade para seguir um rumo soberano, a UE entrou efetivamente em colapso, ao que parece. Está agora a colher os seus frutos. Precisa de alguém que lhe possa dizer isso. Pensem nisto. A União Europeia que engloba dezenas de países que têm as suas embaixadas aqui em Moscovo, um enorme número de diplomatas, burocratas e funcionários, além do Alto Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, Josep Borrell, precisa de mediação para conhecer a posição da Rússia.
O que é que fazem os diplomatas da UE acreditados em Moscovo? O que é que fazem se não conseguem informar Bruxelas da posição da Rússia sobre os Acordos de Istambul? O que é que faz a Representação da UE? O que é que fazem todos eles?
Há mais uma prova do seu impasse ideológico. Tentam em vão convencer a comunidade internacional (e talvez até a si próprios) de que as medidas restritivas impostas pela UE contra o setor agroindustrial russo não têm um impacto devastador na segurança alimentar global.
Agora, algo começa a preocupá-los. Mesmo assim, estão a aplicar uma série de sanções: proibição de exportação para a Rússia de uma vasta gama de máquinas e peças sobressalentes, embargo ao fornecimento de certos grupos de fertilizantes nacionais, sanções pessoais contra os proprietários/gestores dos principais produtores e exportadores de fertilizantes nacionais: a Uralkhim, a Eurokhim, PhosAgro, Akron, bloqueio económico da Crimeia e de Sebastopol, incluindo as suas infraestruturas portuárias, a proibição de acesso dos bancos russos, entre os quais o Rosselkhozbank (Banco Agrícola Russo) que presta serviços às exportações agrícolas russas, ao sistema SWIFT, numerosas restrições à prestação de serviços financeiros, de corretagem, de seguros e de transporte às empresas russas, bem como restrições à circulação de navios mercantes russos. E isto é apenas uma parte da extensa lista de restrições impostas pela UE ao nosso país.
Há mais de um ano, criámos uma secção temática regularmente atualizada no sítio web do MNE russo intitulada "Desfazendo os mitos criados pela UE", na qual expomos, baseando-nos em factos reais e numa análise de artigos do quadro jurídico europeu, as ações intencionais da UE que prejudicam os esforços internacionais para fornecer alimentos e fertilizantes aos países necessitados. Algumas isenções das sanções antirrussas publicitadas de forma empenhada pelos líderes europeus são predominantemente de natureza recomendatória e não funcionam na prática. Não se trata apenas dos procedimentos burocráticos extremamente complicados que estão a cargo dos Estados-Membros da UE, mas também do facto de as empresas europeias e os círculos empresariais em países terceiros serem deliberadamente intimidados por Bruxelas que chega ao ponto de ameaçar com processos penais. É no que diz respeito à democracia. Até foi criada a figura de emissário especial da UE que viaja por todo o mundo e tenta forçar as autoridades de países soberanos a aderir às restrições ilegítimas da UE. E depois ficam surpreendidos ao saber que, no final de contas, as medidas impostas contra a Rússia atingem também a situação mundial.
A situação só pode ser remediada se os regulamentos de sanções da UE forem alterados. Os tão apreciados esclarecimentos jurídicos não vinculativos da Comissão Europeia não passam de declarações ocas.
O elemento-chave é que quaisquer alterações devem ser aprovadas por todos os Estados-Membros da UE. Com a russofobia a passar dos limites nas capitais da Europa, esta opção é irrealista. Já dissemos várias vezes que a minoria da UE (os países pró-EUA, por exemplo, os países bálticos e a Polónia) estão simplesmente a dizer à maioria da UE o que deve fazer e como deve fazê-lo. Vemos que estão dispostos a fazer qualquer sacrifício utilizando os povos dos países da UE, e não falam de modo algum sobre medidas de desenvolvimento. O mais importante é não mostrar fraqueza ao nosso país. Se os líderes da UE precisam de um apoio da ONU como possível alavanca de pressão sobre os seus próprios defensores do terrorismo por meio de sanções desencadeado pela UE, só podemos aplaudir qualquer contacto entre Bruxelas e os representantes da ONU.
Em todo o caso, a Rússia, juntamente com parceiros fiáveis, continuará a trabalhar de forma ativa e independente para garantir a segurança alimentar mundial.
Pergunta: O plano dos EUA de fornecer munições de fragmentação à Ucrânia provocou uma condenação e uma controvérsia generalizadas. Como é que o lado russo avalia o facto de Washington não dá ouvidos à opinião da comunidade internacional e dos seus aliados, e insistir em prestar este apoio militar a Kiev?
Maria Zakharova: Aplicamos a mesma formulação usada pelos Estados Unidos em relação aos países que utilizam munições de fragmentação. Os norte-americanos consideram estes países criminosos de guerra. Não tenho nenhuma razão para contestar este facto.
Porque é que os Estados Unidos não dão ouvidos à opinião da comunidade internacional? Porque são "excecionais". Se calhar são apenas surdos. Pode ser que as duas hipóteses sejam corretas. Na minha opinião, porque as apostas são demasiadamente grandes. Para eles, a situação na Ucrânia é de importância fundamental para mostrar a sua força. Dado que as apostas nesta "guerra relâmpago", apostas no sufocamento económico e na intervenção nos assuntos internos para desestabilizar a situação não deram certo (e os EUA não acreditam que venham a ganhar), recorrem a ações nervosas e neurasténicas ao arrepio dos seus próprios compromissos e da sua política dos últimos anos apenas com o objetivo de continuar a pressionar-nos esporádica e histericamente em todas as áreas. Em suma, estão a abrir uma cova para nela cair.
Pergunta: O Ministro dos Negócios Estrangeiros da Federação da Rússia, Serguei Lavrov, chefiará a delegação russa à cimeira dos BRICS e visitará pessoalmente Joanesburgo. Os meios de comunicação social sul-africanos noticiaram anteriormente que os anfitriões haviam sugerido à Rússia que Serguei Lavrov chefiasse a sua delegação, mas o lado russo rejeitou a sua proposta. Pode confirmar estas notícias? Porque foi decidido que o Ministro dos Negócios Estrangeiros russo chefiará a delegação russa?
Maria Zakharova: Comecemos com a sua segunda pergunta. Sabe muito bem, pode fazer uma análise retrospetiva (pelo menos aos acontecimentos ocorridos nos últimos 10 anos), que este esquema foi utilizado muitas vezes. O Presidente russo discursou por escrito ou via televisão, o Ministro dos Negócios Estrangeiros ou um representante de outro organismo nosso participaram em cimeiras. Este esquema foi utilizado várias vezes.
É da competência de um país decidir como fazer-se representar, e não da imprensa (com todo o respeito), nem dos analistas políticos ou de outras personalidades. Por isso, o nosso país tomou a sua decisão. Para dizer a verdade, não tenho conhecimento de qualquer informação adicional que possa ser do seu interesse. Não posso confirmar o que disse. Não tenho esta informação. Gostaria de sublinhar, mais uma vez, usamos várias vezes e por razões diferentes este esquema de participação em numerosas ocasiões.
Pergunta: Pode confirmar que nesta situação a decisão da Rússia teve como causa o acórdão do TPI que está agora na boca de todo o mundo?
Maria Zakharova: Já respondi a esta pergunta. Essa decisão já foi tomada. Esta fórmula foi utilizada muitas vezes e continua a ser utilizada. Não disponho de maiores informações.
Estou certa de que, neste caso, não vale a pena procurar razões tácitas, intrigas nem outras coisas ocultas. Sei que a informação divulgada causa interesse. Eu também sei que, a dada altura, a imprensa ficará histérica sobre esta história. No entanto, há que saber voltar à realidade. A Rússia participa em muitos eventos internacionais. Muitos outros países também utilizam esquemas semelhantes. Respeitamos as suas decisões. Parece-me que nós também podemos esperar uma atitude semelhante para com as nossas decisões.
Pergunta: Há alguns dias, o Politico escreveu sobre eventuais alternativas ao acordo de cereais, assinalando como uma das alternativas a possibilidade de as embarcações com cereais ucranianos serem escoltados por navios de guerra turcos. Ao mesmo tempo, o Politico não considera esta opção realista porque "pode provocar um confronto aberto entre a Turquia e a Rússia". O que pensa sobre isto? Poderá esta opção provocar realmente um conflito militar entre os dois países? No contexto da declaração do Ministério da Defesa russo de que a Rússia considerará todos os navios que entrem na sua zona como potencialmente perigosos (envolvidos no transporte de armas), irá a Rússia, se possível, opor-se a rotas alternativas para a exportação de cereais ucranianos para os mercados mundiais?
Maria Zakharova: Os pormenores desta questão serão expostos amanhã num briefing especial pelo Vice-Ministro dos Negócios Estrangeiros da Federação Russa, Serguei Vershinin.
Quanto ao artigo do Politico sobre eventuais rotas alternativas para o escoamento dos cereais e os alimentos.
Verifica-se uma coisa curiosa. Há um ano, o acordo sobre os cereais e todos os entendimentos foram alcançados depois de jornais como o Politico terem gritado histericamente que o mundo estava a passar fome, que as pessoas mais pobres estavam a passar fome e que era urgente fornecer-lhes cereais. Passou-se um ano, todos os meios de comunicação ocidentais continuam a fazer vista grossa ao facto de as palavras estarem a divergir dos atos. Tudo isto virou uma fraude. Não resta nada dos objetivos humanitários declarados.
De um modo geral, os meios de comunicação ocidentais foram também utilizados pelas elites financeiras e políticas ocidentais para concluir este acordo que, na realidade, teve como base os interesses económicos. Não têm vergonha de admitir que o surto de histeria não passou de uma campanha propagandística? É preciso começar por analisar os objetivos declarados: trata-se de um projeto comercial? Mas, entretanto, há ali hostilidades, estão a ser cometidos ataques terroristas contra a nossa Frota do Mar Negro e o nosso povo.
Sei que, para os ocidentais, o dinheiro "não tem cheiro" ou tem "cheiro agradável". Mas os ataques terroristas perpetrados pelo regime de Kiev orientado pelos serviços secretos ocidentais ceifaram a vida de alguns dos nossos cidadãos. Por que razão este assunto não está a ser abordado e está a ser suplantado pelo tema do "acordo de cereais" sem que sejam analisados os seus motivos e objetivos? Fico pasmada com isso. Isso quando os meios de comunicação social ocidentais costumam realizar investigações por qualquer motivo, são muito bons nisso. Este é um motivo muito bom para realizar uma investigação. Só depois de este acordo ser submetido a uma análise para se ver quem estava interessado nele, quem ganhou com ele e quem o promoveu, usando também para o efeito os mass media, poderemos, na minha opinião, começar a falar de formas alternativas de fornecimento de cereais.
Há que ter em conta quem é, desta vez, o beneficiário das vias de entrega alternativas e quem está a pagar por elas e pela propaganda nos meios de comunicação social. Este tipo de ataque informativo lançado há um ano era impossível sem apoio. Tenho a certeza absoluta do que estou a dizer. É impossível ignorar todas as manobras e manipulações da opinião pública. É nisso que reside o âmago da questão e isso que deve ser objeto de debates. Há que falar sobre as empresas ocidentais que obtêm lucro duplo com a mesma coisa, com as vigarices que os seus governos estão a fazer, que vão continuar a enganar a comunidade internacional. Os países mais pobres recebem 3% das entregas efetuadas. O Ocidente ficou com a maior parte dos cereais e ganhou tanto que vários países da UE já perderam os seus agricultores e os seus próprios mercados. É disto que se trata, e não de como estes cereais serão contrabandeados para algum lado. A única coisa que importa é para onde os cereais estão a ir, quem os está a desviar e qual é o seu objetivo.
Gostaria de acrescentar a tudo isto a questão do duto de amónia. Todo o mundo finge esquecer-se de como esta infraestrutura foi feita explodir. Estão a ver, acontece que os países mais pobres não precisem mais de fertilizantes? Gostaria de recordar que o duto de amónia satisfazia as necessidades de 45 milhões de pessoas. Então, nem o Politico nem a comunidade internacional se preocupam com o destino do duto de amónia e dos fertilizantes em geral? Ninguém se preocupa? É este o nível do seu interesse. Os artigos de que fala publicados no Politico e em publicações semelhantes foram obviamente "plantados". Não sei qual é o mecanismo. Não tenho a informação. Mas estou a ver o resultado. Abrem o caminho aos beneficiários, àqueles que lucram com o derramamento de sangue, prolongando as fraudes em que estão implicados. É impossível não o ver.
Pergunta (tradução do inglês): De acordo com fontes dos serviços secretos ucranianos, a Rússia vai entregar alguns dos seus prisioneiros de guerra à Hungria no próximo mês. Se isto é verdade, porquê vai fazê-lo? No futuro, se os militares ucranianos de origem húngara (recrutas) se renderem, poderão esperar um tratamento semelhante?
Maria Zakharova: Não vou comentar as "notícias plantadas" pelos serviços secretos ucranianos, pois é inútil fazê-lo. Sabemos que se trata de uma sabotagem de informação.
Quanto aos prisioneiros de guerra ucranianos, eles são tratados de forma humana na Rússia. Pode consultar as nossas fontes oficiais e os materiais divulgados pela Provedora dos Direitos Humanos da Federação da Rússia Tatiana Moskalkova. Ela publica e fornece regularmente comentários sobre este assunto. Os próprios militares ucranianos, que se encontram em cativeiro, também falam deste facto. São-lhes prestados cuidados médicos, alimentação normal e alojamento. Uma nuance importante a destacar sobre como os cidadãos da Hungria ou os ucranianos de origem húngara são feitos prisioneiros. Gostaria de referir que a nossa atitude para com os prisioneiros não depende da sua nacionalidade. Não sei nada sobre as tradições que existem noutros países, o nosso país e a nossa sociedade são multiétnicas. O multietnismo está presente em todas as esferas da sociedade, cultura, ciência e educação. É neste princípio que tratamos os prisioneiros de guerra. Posso assegurar-vos que a atitude para com os prisioneiros não se baseia na sua nacionalidade, no corte dos seus olhos, na forma do seu nariz e orelhas, no tamanho do seu crânio. Num contexto histórico, outros países tiveram esse comportamento. Agora, isso está a acontecer não só em relação aos prisioneiros, mas também em relação a outras pessoas. O Ocidente está a fornecer cuidados e serviços médicos. Sabem muito bem como muitos Estados estão organizados segundo linhas nacionais. Nós não temos nada disso.
Gostaria de referir que o número de pessoas que não querem lutar ao lado das tropas ucranianas e preferem depor as armas vem aumentando de dia para dia. A comprová-lo está a campanha de recrutamento em curso na Ucrânia. Os métodos usados remontam aos tempos selvagens da Idade Média. As pessoas são arrastadas para as ruas, metidas em carros, amarradas e algemadas e levadas ao abate.
Pergunta (tradução do inglês): Gostaria de fazer uma pergunta sobre os húngaros da Transcarpátia e os seus laços com a Ucrânia. Tal como os russos, os húngaros sofreram com as políticas chauvinistas do regime de Kiev. O que é que pensa sobre isso?
Maria Zakharova: A Ucrânia está a realizar uma campanha de mobilização à força. Os recrutas são espancados e raptados contra a sua vontade e levadas para o campo de batalha como "carne para canhão" sem treinos prévios. As regiões ocidentais do país, incluindo a Transcarpátia, não são exceção. O nacionalismo está a ganhar força na Ucrânia. A Hungria está bem ciente disso, inclusive através de declarações públicas feitas por representantes húngaros.
Pergunta (tradução do inglês): Que eu saiba, o Grupo Rheinmetall e o regime de Kiev estão dispostos a construir uma fábrica na Transcarpátia, perto de uma povoação húngara. Não acha que isto é uma espécie de provocação ou um ato para forçar o governo húngaro a abandonar a sua neutralidade se a Transcarpátia se tornar um alvo das tropas russas?
Maria Zakharova: Sim, houve notícias de o Grupo Rheinmetall planeia construir uma fábrica na Transcarpátia perto de uma povoação húngara. Se esta notícia for confirmada, isso será uma provocação global e outra prova de militarização da Ucrânia pelo Ocidente e de fornecimentos maciços de armas para fazer escalar o conflito. Essa fábrica, se for construída, tornar-se-á, juntamente com quaisquer outras instalações da indústria de guerra da Ucrânia, um alvo militar legítimo para as forças russas. Se estes planos forem reais, então trata-se de uma provocação a que o regime de Kiev e os seus patrões ocidentais gostam tanto de recorrer.
Pergunta: Porque é que a Rússia tem de combater a Ucrânia e não pode ameaçar diretamente os EUA para que estes pensem bem se vale a pena continuarem a fornecer armas?
Maria Zakharova: A Rússia não está em guerra com a Ucrânia. A Rússia está a repelir uma agressão híbrida por parte do Ocidente. A Ucrânia tornou-se a sua "moeda de troca": um refém, uma vítima e um instrumento. É necessário distinguir as duas coisas. É como uma história de manipulação. Tudo parece ser óbvio. Há a Rússia, a Ucrânia, e há um conflito. Para as pessoas não familiarizadas com o âmago da questão, que não conhecem a história moderna ou global, pode parecer assim. Infelizmente, é assim que é apresentado nos meios de comunicação ocidentais e em regiões remotas do mundo, não tão dedicadas aos acontecimentos. Na realidade, não é assim.
Durante todas estas décadas, a Rússia não teve qualquer desejo de fazer outra coisa que não fosse cooperar. Reconhecemos a soberania da Ucrânia, construímos uma relação genuína de respeito por este país enquanto Estado soberano, trocámos embaixadas, celebrámos acordos bilaterais, enviámos embaixadores. Tudo isto mostrava que tínhamos uma relação especial, mas ao mesmo tempo respeitávamos a sua soberania. Para além disso, nunca, em todas as décadas que antecederam o golpe de Estado de 2014 que pôs em marcha a dinâmica destrutiva do colapso do sistema estatal na Ucrânia, a Rússia fez quaisquer reivindicações ou levantou a questão da pertença da Crimeia. Limitou-se a ajudar os seus compatriotas. Com base nas relações bilaterais, desenvolveu laços humanitários e económicos. Os acordos sobre a Frota do Mar Negro foram exclusivamente jurídicos. Eram, antes de mais, favoráveis à Ucrânia, que recebia fundos avultados para o efeito. Não havia qualquer intenção de agravar questões problemáticas, de as levar ao nível de conflito.
Aí veio o Ocidente. Logo após a Ucrânia pisar no caminho de soberania. Estava presente, embora ilegalmente, no país também antes. Depois começou a "legalizar" o seu estatuto. Nos organismos estatais da Ucrânia foram colocados agentes dos serviços secretos dos EUA e dos países da NATO. Estrangeiros, pessoas diretamente ligadas a países estrangeiros, com passaportes, permissões de residência, apoio financeiro e interesses ocidentais começaram a ocupar lugares nas estruturas governamentais. Assim, iniciou-se a destruição do sistema estatal ucraniano e a sua colocação sob o controlo do Ocidente. Em seguida, foram criadas figuras fantoches e o governo. A mando dos EUA, os laços que tínhamos com a Ucrânia, tanto no seio da URSS como antes e depois, começaram a ser destruídos.
Depois, este país começou a transformar-se num campo de ensaio da NATO, preparando-se para se tornar mais uma base da NATO com um objetivo agressivo óbvio contra o nosso país. Foram feitos todos os esforços políticos e diplomáticos, oportunidades e propostas para resolver esta questão absolutamente absurda. Porque nos foi dada a garantia de que a NATO não se expandiria para Leste. A questão teria sido resolvida por métodos políticos e diplomáticos. A Rússia fez numerosas propostas, tendo todas sido rejeitadas pelo Ocidente. Assim, os golpes de Estado e o colapso do sistema estatal tiveram lugar face ao nacionalismo crescente, que não surgiu há dez anos, mas que há muito vinha sendo implantado e alimentado pelo Ocidente. Tudo isto provocou confrontos diretos entre a NATO e a Rússia. No verão de 2021, durante os exercícios, um contratorpedeiro britânico tentou violar a fronteira russa no Mar Negro. No outono de 2021, foi registada no nosso espaço aéreo uma aproximação perigosa entre aviões de combate da NATO e aviões civis da Rússia e de outros países. De que tipo de conflito russo-ucraniano se pode falar quando se trata das ações da aliança liderada pelos EUA, a Grã-Bretanha e os seus satélites, como os países bálticos e a Polónia, para desencadear um conflito no território da Ucrânia contra o nosso país. A isto devemos acrescentar as sanções económicas impostas à Rússia muito antes de 2022, com o objetivo de "sufocar" economicamente o nosso país, "tornando-o" dependente dos países ocidentais. O setor de energia foi um dos principais "pontos de interesse" do Ocidente na Ucrânia, a fim de controlar o trânsito do gás russo para a Europa. Um projeto económico absolutamente normal, do qual a Ucrânia recebia grandes receitas, que era puramente pacífico, orientado para a cooperação de todo o continente europeu, era um "osso na garganta" para os EUA. Utilizaram-no constantemente como ponto de dor para controlar o fornecimento de gás russo à Europa, para influenciar os preços e para criar uma zona antinatural de tensão e instabilidade em torno de questões energéticas no continente europeu, a fim de substituir o gás russo pelo gás norte-americano e controlar completamente toda a situação. Não podia deixar de reagir a isto, respondendo à sua frase.
Quanto à sua pergunta, deixe-me explicar. O agressor não é a Rússia, mas sim os Estados Unidos. E nós estamos a repelir essa agressão. Tudo o que é necessário para isso está a ser feito.
Pergunta: Porquê? Estão a fazê-lo porque não há ameaça para os EUA, certo? Talvez a Rússia devesse...
Maria Zakharova: Não. Há uma ameaça para os Estados Unidos. Talvez fique surpreendido. Acabamos de falar sobre a Sérvia. Os norte-americanos vêem a própria existência do Estado sérvio e da nação sérvia como ameaça para eles próprios. Eles têm uma perceção diferente da ameaça.
Vêem como ameaça uma Rússia forte, multiétnica, multirreligiosa, com recursos utilizados no interesse do povo do nosso país e não no interesse do seu grande capital. Vêem a sua própria economia como ameaça. A dívida nacional dos EUA é de 32 biliões de dólares. Farão tudo para criar focos de instabilidade em todo o mundo, para o manter à tona com uma dívida que nunca conseguirão cobrir. Uma mentalidade diferente, uma lógica diferente.
Os norte-americanos já têm um número colossal de ameaças instaladas no seu país. Os norte-americanos precisam de uma expansão agressiva em várias esferas, desde a economia até aos confrontos diretos nas fronteiras externas, só para se defenderem das suas próprias ameaças. Não conseguem reconhecer a crise em todas as esferas do seu país: da economia à vida social e política. Os norte-americanos são "excecionais", mandam no mundo, como eles próprios acreditam. É esta a diferença.
A oposição norte-americana grita que a adoção das moedas nacionais é uma ameaça direta para os Estados Unidos. Pensem nisso! Os países estão dispostos a usar as suas moedas nacionais nos desembolsos recíprocos. Isso é visto pelos EUA como ameaça existencial. Porque o controlo sobre a circulação de dólares é da parte deles. Porque o Departamento do Tesouro dos EUA e os serviços secretos dos EUA controlam todas as transações monetárias em dólares? Não têm direito de fazer isso. É ilegal de todos os pontos de vista. Mas eles fazem-no. Por conseguinte, quando os países começam a "sair" da "moldura" criada pelos EUA, entendem-no não como arbitrariedade, mas como ameaça para eles próprios.